quarta-feira, 23 de junho de 2010

Monografia - Crianças em estado terminal: Educação para a morte

O texto que estou postando hoje é a introdução da monografia que eu fiz no ano passado, 2009, como projeto de conclusão de curso do Ensino Médio, no Colégio Equipe. O trabalho aborda a questão das crianças com doenças terminais e como elas, suas famílias, a sociedade e o hospital lidam com isso. Aqui vai apenas a introdução porque achei que era o pedaço que cabia ser postado fora do contexto geral do trabalho, se houver algum interesse eu posso postar o resto dela aos poucos.

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ENSINA-ME A MORRER
Crianças em estado terminal: Educação para a morte
Uma criança, em seu quarto à noite, vê uma sombra medonha na janela, algo que ela não sabe o que é. Por não saber, ela começa a imaginar criaturas terríveis, verdadeiros monstros, e fica apavorada. Porém, quando esta criança cria coragem e vai verificar o que há atrás da janela, ela vê uma árvore com muitos galhos, porém inofensiva. O fato de ver a árvore a conforta, a tranquiliza e dispersa o medo.
O que quero dizer com esta metáfora é que não ter conhecimento sobre o que é a morte - devido à falta de informação a este respeito - contribui para o medo que existe em volta dela, o medo do que não sabemos explicar. Entender a morte é necessário para que possamos compreender nossa existência na condição de seres finitos, pois a morte faz parte da vida.
Considero importante citar que o histórico de nossa sociedade ocidental e cristã contribui fortemente em nossas atuais concepções, ou seja, nossa herança cultural define nossa visão de morte. Numa fala breve sobre isto, anteriormente tinha-se uma idéia de que se podia controlar a morte magicamente, o que facilitava sua integração psicológica, aproximando o homem da morte com menos terror. Na Idade Média ocorreram diversos eventos causadores da morte em massa [Ver "Um estudo teórico da morte"], o que quebrou esta visão do controle mágico e o homem passou a viver tendo a morte como uma constante ameaça, que poderia pegá-lo de surpresa. Esse súbito descontrole em relação à morte pode ser uma explicação para o surgimento de temores.
Assim, conteúdos negativos, perversos e macabros passam a ser relacionados à morte, tais como torturas e flagelos, o que provoca um estranhamento do homem em relação a isto.
A morte é vista como castigo ou punição e está ligada a uma ação má, a um acontecimento medonho [Ver "Sobre a morte e o morrer", Elizabeth Kubler-Ross]. Para lidar com este acontecimento visto como desconhecido e negativo, o homem cria mecanismos de defesa, dentre eles, fantasias. As fantasias podem ser boas ou ruins, sendo as boas, fantasias de que exista uma vida após a morte, num mundo paradisíaco, sem sofrimento e as ruins, fantasias que ligam a morte ao inferno, com figuras diabólicas, pavores de aniquilamento, desintegração e dissolução, que estão relacionados aos sentimentos de culpa e remorso inerentes à nossa herança cultural cristã. Estas fantasias criadas para uma defesa psicológica do mistério que é a morte são uma espécie de negação da morte.
Cada vez mais os produtos antiidade são procurados e a função do hospital como defensor da morte vem aumentando, o que comprova a tentativa de evitar e negar a morte. Coloca-se tudo nas mãos dos médicos e das tecnologias que cada vez mais criam meios de prolongar a longevidade. Procura-se ter boa saúde física, se alimentando bem e se exercitando, evitando lugares perigosos, entre outras coisas, a fim de afastar a morte.
Além de afastar a morte em si, as pessoas em geral tentam evitar até mesmo falar sobre a morte, como se apenas falar sobre o assunto trouxesse uma espécie de azar que poderia atrair algum evento fatídico. Este medo, esta renúncia em falar sobre a morte está muito relacionada à forma como ela é vista, é claro, mas também está relacionada à grande tristeza que caminha junto com o tema. A morte está relacionada à ausência, à perda, à separação. Quando algum ente querido morre, a sensação que invade a maioria das pessoas é a de tristeza, pois aquela pessoa que está partindo nunca mais será vista, nunca mais contará uma história, nunca mais vai dar um abraço ou um beijo, nunca mais estará, de fato, presente conosco. O que acontecerá com ela é desconhecido e, por seu mistério, nos dá medo.
Devido às concepções da sociedade e à relação com a tristeza, a morte é um assunto pesaroso e as pessoas procuram não falar dela. Além disso, falar sobre a morte é desagradável, pois entramos em contato com as nossas próprias limitações enquanto seres humanos e entrar em contato com estas limitações é entrar em contato com nossas impotências. Atualmente existe uma grande necessidade de se falar sobre a morte, justamente ela existência de "tabus" a seu respeito que devem ser quebrados. Além disso, a morte está presente, querendo nós ou não, na nossa sociedade, no nosso cotidiano. Está na televisão, nos jornais, na casa do vizinho, na novela, nas guerras, na nossa própria casa, enfim, em todo lugar.

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